segunda-feira, 2 de novembro de 2015

A REPRESENTATIVIDADE ELEITORAL e A REPRESENTATIVIDADE PARLAMENTAR





       




         O VOTO, a ELEIÇÃO PARTIDÁRIA e a REPRESENTAÇÃO PARLAMENTAR






No actual momento da vida política portuguesa, e resultante do acto eleitoral do dia 04 d e Outubro, é bem sabido que se apresentam duas perspectivas em termos da governação: o da direita, expressa pela coligação PSD/CDS e o da esquerda representada no acordo ainda não divulgado mas prometido por PS/BE/CDU, sendo que o partido PAN aguarda uma tomada de posição na altura das votações que irão seguir.
Os ânimos andam exaltados do lado de formações políticas "degladiantes" e o próprio  Sr. Presidente da República (P.R.), elogiado por uns e criticado por outros, já disse que não está em nada arrependido dos actos praticados e pelas palavras proferidas neste enquadramento.
Para uma apreciação que pretendo analítica e baseada em factos e princípios e do rumo certo e sério que merece ser adoptado, torna-se necessária a abstracção das simpatias políticas e ideológicas que obviamente todos nós temos, mas que não podem nem devem interferir na avaliação das actuações políticas que se vão sucedendo no tempo para que surja um Governo verdadeiramente representativo do anseio do povo.
O VOTO: Uma eleição legislativa, tal como o nome indica, visa nomear alguém que tem a seu cargo legislar. Legislar  não se confunde com governar, embora o governo tenha também competência para elaborar leis, a verdade, por via de princípio é que, o que se visa eleger são os elementos que compõem o Corpo Legislativo ou seja, aqueles que em nome do povo irão elaborar leis que serão usadas por um outro Corpo; o primeiro - Assembleia da República (A.R.)e o segundo - Governo. Uma eleição legislativa, não é uma eleição governamental. É bom atentar que cabe à A. R. conferir autorizações legislativas ao Governo e que, de um modo geral, qualquer acto legislativo  do Governo (à excepção da respeitante à sua organização e funcionamento) pode estar sempre sujeita à ratificação pela Assembleia da República. Daí que a Assembleia da República seja o 2º na escala de Órgãos de Soberania.
OS ELEITOS: São os deputados apresentados pelos Partidos ou Formações político/partidárias (ex: Coligações). É natural que a encabeçar a lista apareça o Secretário - Geral ou quem preside aos destinos do agrupamento político, sendo que ele próprio se inclua no número de deputados pertencentes ao grupos, podendo ainda ser ele a ser indigitado para formar governo atendendo ao ditame do artigo 187º.1. da Constituição da República - mas não necessariamente. A indigitação pode recair num outro. Nos termos deste preceito o 1º Ministro é nomeado pelo P.R., ouvidos os partidos representados na A.R. e tendo em conta os resultados eleitorais. Sucede que, no caso concreto, o P.R. não respeitou a 1ª parte deste artigo. Porém, não se lhe pode levar a mal a indigitação do Sr. Passos Coelho  para o cargo, atendendo a que, no contexto, o PSD foi o partido com mais votos que os demais, e o grupo da esquerda, naquela altura, não apresentou especificamente a postura de uma real alternativa. O P.R. assentou a sua acção estritamente na 2ª parte do preceito, ou seja, com base no resultado eleitoral, do partido mais votado, segundo sugere, respeitando a tradição.
É bom saber que em termos civis, os costumes, os usos ou as tradições, não constituem, por si, fonte de direito, e muito menos será tratando-se do direito constitucional, onde se jogam interesses sociais, variáveis e em permanente mutação e que muitas vezes não coincidem com o chamado direito costumeiro. Vem isto a propósito para significar que em termos constitucionais, a tradição não chega, pois que esta, dada a sua inevitável resistência à alteração com o andar dos tempos, só se impõe, quando não fere a sensibilidade sociopolítica do povo. No contexto constitucional o respeito pela tradição não pode ser absoluto ou meramente formal; tem de ser material, e isto implica que a) se respeite o ditame da lei e b) a sensibilidade popular; no 1º caso o P.R. teria que ouvir os partidos políticos, para conjugar a tradição com o sentir da população, o que não fez. Deixou assim que a sua decisão ficasse inquinada de imperfeição. No 2º caso, terá que avalisar a sua decisão ouvidos todos os partidos com assento partlamentar, sendo que estes e só estes tem a virtualidade de refletir a sensibilidade popular, aquando da votação ocorrida em 04 de Outubro. Só assim se entende o discurso algo "soft" do P.R. por ocasião da tomada da posse do Executivo, que se tem de assumir como feito pela 1ª figura na hierarquia de órgãos de soberania e portanto de boa-fé política.
O PARLAMENTO: A eleição popular vale pela quantidade (sic. partido ou coligação mais votada) mas à qual é o próprio povo que atribui qualificação através do cômputo numérico de deputados correspondente - e é isto que conta, e todo o cidadão votante é consciente desta realidade política. (nota importante: por um voto se ganha; por um voto se perde. Pode suceder que a um dado partido, só não ter eleito um deputado por lhe faltarem um voto para compor o número total a viabilizar essa eleição. ex: 1 deputado = 50.000 votos e ter alcançado apenas 49.999).
Tal não obsta, no entanto, que um governo saído de uma componente maioritária possa ver o seu programa rejeitado no parlamento. Como qualificar esta situação? Será que o parlamento é contrário ao superior interesse do povo votante? Obviamente que não. E mais: um governo de componente maioritária pode ser demitido pelo P.R. "quando tal se torne necessário para assegurar o regular funcionamento das instituições...." (artigo 195º.2. da Constituição). Quer isto sugnificar que um governo do tipo que vimos referindo não é intocável.
A REJEIÇÃO DE UM PROGRAMA GOVERNAMENTAL: E porque  e como haveria o parlamento de rejeitar o programa de um governo que obteve uma maioria de votos e detém à partida mais deputados que qualquer outro partido com assento parlamentar? Quanto ao 1º aspecto, basta só dizer que a rejeição do programa pode derivar de vários motivos, nomeadamente por adoptar uma política contrária aos interesses nacionais ou mesmo por o autor da rejeição apresentar uma solução mais favorável a esses interesses motivada ideologicamente. Quanto ao 2º aspecto é suficiente uma maioria de deputados que contrarie parlamentarmente a política do governo e como tal rejeite o seu programa. Dispenso aqui tecer considerações sobre o significado ou alcance de uma maioria parlamentar contrária. Em caso de rejeição outros passos se seguirão, entre os quais a intervenção do P. R. com audição obrigatória prévia do Conselho de Estado.
E por cá fico.